Brasília – Não é possível que a divergência acerca da PEC do Abuso de Autoridade se dê em função da autoridade lutar para manter o privilégio inadmissível de continuar abusando da autoridade impunemente.
É isso?
Pois se não é, parece ser.
No ano passado, apresentaram ao Congresso Nacional a proposta de iniciativa popular que garantia, entre outras coisas, que a autoridade poderia colher provas usando métodos legais ou ilegais.
Não por coincidência, porque coincidência só poderia existir se dois corpos pudessem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo, entre os que subscreveram a proposta estão agentes públicos encarregados de investigar e sugerir punição.
Trocando em miúdos, a autoridade quer montar a armadilha; quer autorização para grampear telefones e usar a conversa como provas, sem o risco de vê-la eliminada juridicamente. Agora imagine o que isso poderia acarretar de absurdos e ilegalidades!
Não seria mais o Estado de Direito, mas o Direito do Estado – que, caso aprovado, se colocaria acima do bem e do mal. O agente público ( delegado, promotor, juiz ) se confundiria com o Estado e com a lei, como quem diz: a lei sou eu.
A PEC ora em tramitação no Senado e que é defendida pelo senador Renan Calheiros, apenas suscita o debate antiquíssimo e que nunca foi à prática devido ao corporativismo. Agora, quando os abusos ultrapassaram o limite da tolerância, a discussão retornou aflorada e tudo indica que definitiva.
O senador Roberto Requião, relator da PEC, ele mesmo é vítima de abuso de autoridade, numa disputa política no Paraná, quando foi condenado a indenizar a vítima que a própria justiça constatou depois não ser inocente, mas culpada.
Diz-se que a PEC do Abuso de Autoridade é inoportuna e se confunde com reação à Operação Lava Jata. Sim, e daí? A própria Operação Lava Jato já cometeu abusos quando, por exemplo, prendeu uma inocente porque os investigadores tinham a “convicção” de que era a pessoa que investigavam e não era – a inocente ficou cinco dias presas em Curitiba.
Será que, com a vigência da punição por Abuso de Autoridade, não teria o investigador mais cuidado na investigação? Ou então: quem é que vai ressarcir à vítima os danos causados, sobretudo, o trauma provocado?
São inúmeros os maus exemplos. De ordinário, pune-se com a aposentadoria compulsória o que, convenhamos, não é punição e sim condecoração às avessas.
A autoridade que não abusa das suas prerrogativas e não ultrapassa o limite imposto pela lei, nada tem do que reclamar nem temer. Quanto as demais, que extrapolam e usurpam, o princípio no qual devem se fundamentar é o de que ninguém está acima da lei – apenas isso.