Brasília – Se era um corpo que faltava para o maior espetáculo da terra, no Rio de Janeiro, não falta mais; tem-se aí o corpo do “DG” fresquinho, fresquinho.
Ainda há quem se espante com a violência institucionalizada no Rio e, para esses, eu recomendo o livro do grande Zuenir Ventura.
Intitula-se “Cidade Partida” e contém a Genesis da violência na Cidade Maravilhosa, pois mente quem diz que a violência no Rio é culpa dos traficantes.
É não.
Só quando eu li o livro do Zuenir é que entendi a experiência que vive em 1977 ao chutar uma caixa de sapatos vazia que estava presa por um barbante ao tronco uma árvore
Eu vinha com o Iris, sargento da Aeronáutica e estudante de Medicina que estagiava na Santa Casa de Misericórdia, perto do QG onde tirava serviço como telegrafista.
O Iris era casado com minha prima Anilsa, irmã do Ailton Villanova. Pois bem: depois que inadvertidamente eu chutei a caixa de sapatos fui cercado por três policiais que me perguntavam coisas que eu não entendia – e só então o Iris, que era baiano mas radicado no Rio, entendeu.
O Iris estava a paisano e se identificou como sargento, e só então explicou que eu não residia no Rio, que estava de passagem, e que não sabia para que servia a caixa de sapatos presa ao tronco da árvore.
E não sabia mesmo.
Em 1977, em pleno regime militar, o jogo de bicho era proibido mas ainda assim se jogava; o resultado do jogo era colocado na caixa de sapatos e o apostador já sabia – menos eu, claro.
E o mais interessante é que os três policiais que ficavam de serviço na área não estavam ali para proteger a sociedade e sim a caixa de sapatos com o resultado do jogo do bicho.
Moral da história: você não sabe de que lado vem o bandido; muitos deles usam farda ou distintivos de policiais.
A execução do “DG” é apenas mais uma na estatística macabra dessa guerra entre o morro e a cidade; a diferença é que vai gerar muito barulho e para aplacar a ira é aconselhável apresentar logo os bandidos que o mataram.
Mas, gente, que ninguém execre o Rio de Janeiro por isso; que ninguém pense que esse quadro dantesco surgiu espontaneamente.
Volto ao livro do Zuenir Ventura para lembrar o episodio do filho do general Amauri Kruel, que ara compadre do presidente João Goulart.
Em 1963 o general era o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro e o filho dele foi denunciado por receber dinheiro dos banqueiros do jogo do bicho e bandidos. Foram denuncias escabrosas que levaram à demissão do pai-general.
Mas o compadre que é compadre não deixa o compadre passar vexame e João Goulart nomeou o general Kruel comandante do II Exército, o maior e o mais importante de todos, porquanto abrangia São Paulo e o Paraná.
Infelizmente, em 1964, o general Kruel teve a chance de defender o compadre e não o fez, sob o pretexto de que Goulart não queria romper com o Leonel Brizolla.
Deixando a profundidade de lado e voltando ao cadáver que faltava no Rio e não falta mais, é de se entender que tem sido muitos os estopins que se tem acendido nessa guerra social entre os morros e as cidades – e não é apenas no Rio; é no país inteiro.
E o pior é saber que todo o esforço do governo, todo o gasto do governo visando essa “pacificação” será inútil.
É bom ler também San Tzu, principalmente quando ele ensina que toda guerra demorada traz prejuízo, pois quem sabe a gente aprende que a solução do problema está na Sociologia e na História.
Bob,
E o livro do João Ubaldo “Viva o povo brasileiro” quer nos mostrar o quê? Na realidade somos um povo esclarecido mas não ainda civilizado e tampouco pacificado. Criam-se leis para serem respeitadas pelos pobres. Ricos fazem desdém. A cidade maravilhosa tá pagando o preço de uma mentira originada daquela canção de 1935. O Rio sempre foi o roteiro turístico do mundo todo pela sua beleza geográfica. Agora perdeu para São Paulo. Mas concordo com você. A gestão é grave. Sociológica. Antropológica. Corrupção, aliciamento, tráfico de influência e morte, é o cardápio que está sendo oferecido pelas metrópoles brasileiras. As delegacias de atendimento ao turista terão muito trabalho nesta copa.