80 anos da morte de Lampião
   28 de julho de 2018   │     9:23  │  15

por Aprigio Vilanova*

Lampião com o cineasta libanês Benjamin Abrahão

Em 28 de Julho de 1938 chegava ao fim a trajetória do líder cangaceiro mais polêmico e influente da história do cangaço. A tentativa de explicar a morte de Lampião levanta controvérsias e alimenta a imaginação, dando origem a várias hipóteses acerca do fim de seu “reinado” nos sertões nordestinos.

Existe a versão oficial que sustenta a chacina de Angicos pelas forças volantes de Alagoas e existe também a versão do envenenamento de grande parte do grupo que se encontrava acampado em Angicos.

A versão oficial explica que Lampião e a maior parte de seus grupos se encontravam acampados em Sergipe, na fazenda Angicos, no município de Poço Redondo, quando foram surpreendidos por volta das 5:30 da manhã; as forças volantes de Alagoas agiram guiadas pelo coiteiro Pedro de Cândido e os cangaceiros não tiveram tempo de esboçar qualquer reação. -Lampião é o primeiro a ser morto na emboscada. 

Ao todo foram 11 cangaceiros mortos, entre eles Lampião e Maria Bonita; em seguida, depois da decapitação, deu-se a verdadeira caça ao tesouro dos cangaceiros, desde as jóias, dinheiro, perfumes importados e tudo mais que tinha valor foi alvo da rapinagem promovida pela polícia.

Depois de ter sido pressionado pelo ditador Getúlio Vargas, que sofria sérios ataques dos adversários por permitir a existência de Lampião, o interventor de Alagoas, Osman Loureiro, adotou providências para acabar com o cangaço; ele prometeu promover ao posto imediato da hierarquia o militar que trouxesse a cabeça de um cangaceiro. 

Ao regressarem à cidade de Piranhas as autoridades alagoanas decidiram exibir na escadaria da Prefeitura, as cabeças dos 11 cangaceiros mortos em Angicos. A macabra exposição ainda seguiu para Santana do Ipanema e depois para Maceió, aonde os políticos puderam tirar proveito o quanto quiseram do evento mórbido – a morte de Lampião e o pseudo-fim do cangaço no Nordeste foram temas de muitas bravatas políticas. 

LOCALIZAÇÃO

O acampamento onde estava Lampião e seu grupo ficava na margem direita do rio São Francisco, no Estado de Sergipe, município de Poço Redondo. A gruta de Angicos está situada a 1 km da margem do Velho Chico e estrategicamente favoreceu ao possível ataque da polícia alagoana.

O local do acampamento é um riacho temporário que na época estava seco e a grande quantidade de areia depositada formava um piso excelente para armar o acampamento. Mas, por ser uma grota, desfavorecia aos cangaceiros que estavam acampados embaixo. 

DE VIRGULINO A LAMPIÂO

Virgulino Ferreira da Silva nasceu no município de Serra Talhada, em Pernambuco, e se dedicou a várias atividades: vaqueiro, almocreve, poeta, músico, operário, coreógrafo, ator, estrategista militar e chegou a ser promovido ao posto de capitão das forças públicas do Brasil, na época do combate à Coluna Prestes, no governo de Getúlio Vargas.

Sua infância foi como a de qualquer outro menino nascido no sertão nordestino; pouco estudo e muito trabalho desde cedo. Ainda menino, Virgulino recebe de seu tio um livro da biografia de Napoleão Bonaparte o que vai permitir a introdução de várias novidades desde o formato do chapéu em meia lua, algo inexistente até a entrada de Lampião no cangaço, até a formação de grupos armados e passando por táticas de guerra. 

O jovem Virgulino percorreu todo o Nordeste, do Moxotó ao Cariri, comercializando de tudo pelas cidades, povoados, vilas, sítios e fazendas da região – ele vendia bugigangas, tecidos, artigos em couro; trazia as mercadorias do litoral para abastecer o sertão. Na adolescência, por volta dos 19 anos, Virgulino trabalhou para Delmiro Gouveia transportando algodão e couro de bode para a fábrica da Pedra, hoje município homônimo do empresário que o fundou.

As estradas eram precárias e o automóvel algo raro para a realidade brasileira do início de século XX; o transporte utilizado por esses comerciantes para chegarem aos seus clientes era o lombo do burro. Foi daí que Virgulino passou a conhecer o Nordeste como poucos e esta fase de sua adolescência foi fundamental para a sua permanência, durante mais de vinte anos, no comando do cangaço.

E O QUE MUDOU?

O cangaço foi um fenômeno social bastante importante para a história das populações exploradas dos sertões brasileiros. Existem registros que datam do século XIX e que nos mostram a existência deste fenômeno por mais ou menos dois séculos.

O cangaço só se tornou possível graças ao desinteresse do poder público e os desmandos cometidos pelos coronéis e pela polícia com a subserviência do Estado. 

O sertão nordestino sempre foi tratado de forma desigual em relação à região litorânea, e o fenômeno da seca sempre foi utilizado para manutenção dos privilégios da elite regional. O fenômeno social do cangaço não deixa de ser uma reação a este modelo desumano de ocupação do território brasileiro, e à altíssima concentração de renda e de influência política. 

O governo brasileiro nunca ofereceu os direitos básicos, fundamentais aos sertanejos; o Estado jamais ofereceu educação, saúde, moradia, emprego o que tornou a sobrevivência no sertão complicada; o único braço estatal conhecido na região é a polícia, que, como sabemos, age na defesa do “status-quo”, é prepotente e intimida.

O poder dos coronéis do sertão era o que prevalecia em detrimento dos direitos fundamentais da população. A economia sertaneja era basicamente a criação de gado para o suprimento do país, a carne do sertão abastecia os engenhos de açúcar e as cidades do Brasil. O sertão historicamente foi ocupado com a pecuária.

Passado 80 anos a realidade do sertão nordestino não mudou muito; o cangaço se foi e no lugar surgiram pistoleiros de aluguéis que moram no asfalto; e os coronéis de antigamente hoje estão espalhados e infiltrados nos três poderes, gozando de foro privilegiado. A seca ainda vitima milhões de sertanejos, que continua sendo tratada da mesma forma assistencialista do passado. Finalmente, a corrupção continua a mesma; mudaram os personagens e a moeda. 

E, infelizmente, a impunidade que também é a mesma de muito antes do cangaço.

Assista o vídeo com as imagens que foram recuperadas de Benjamin Abrahão

*Jornalista formado na Universidade Federal de Ouro Preto – MG

COMENTÁRIOS
15

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  1. antonio, o eleitor mineiro

    PARA BOLSONARO, A AMAZÔNIA NÃO É NOSSA!

    “AVIÕES MILITARES AMERICANOS POUSAM NO AEROPORTO DE MANAUS.

    Dois aviões militares dos Estados Unidos pousaram nesta semana no aeroporto de Manaus, intrigando amazonenses; entre as suposições levantadas por todos que avistaram as aeronaves, estava a de que os aviões teriam trazido armamentos e militares para treinar na Amazônia, de onde seguiriam para realizar a suposta invasão à Venezuela”

  2. PROGRESSISTA PORRETA

    BELEZA DE TEXTO. OITENTA ANOS QUE O VERDADEIRO LAMPIÃO SE FOI. MAS ORIGINOU-SE OUTROS CANGACEIROS, RAPINAGEM DA POLÍTICA. AGORA VEMOS UM LAMPIÃO QUERENDO SER PRESIDENTE. SEU DISCURSO É MATAR AS MINORIAS E ESCRAVIZAR AS MULHERES. JÁ SABEM DE QUEM ESTAMOS FALANDO, NÉ?

    1. Guilherme F.M. Albuquerque

      kkkkkkkkk sabemos muito bem a quem se refere kkkkkkk porém, apesar todo esse fascismo, o lampião-fake Bolsonaro se amarra no Lula kkkkkk principalmente se o futuro presidente Lula estiver sem camisa kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

  3. Paulo

    Já dizia Luiz Gonzaga em uma de suas musicas: O cangaço continua de gravata e jaquetão, sem usar chapéu de ou couro e sem bacamarte na mão e matando muito mais, ta cheio de lampião.

  4. Há Lagoas

    Finamente uma noticia isenta de qualquer ideologia doutrinaria. Em textos assim nasce um fio de esperança de que é ainda possível fazer um bom jornalismo, sem militância, ou qualquer outro direcionamento pessoal de ideologias meramente pessoais.
    E se tratando de nosso amado sertão, a República não mudou nossa sorte, apenas acolheu sobre suas asas os descendentes dos coronéis de outrora.

  5. Silva

    Sobre o assunto, o livro de Rui Facó “Cangaceiros e Fanáticos” fornece os motivos de tal movimento do nordeste brasileiro, desmistificando o cangaço numa época de coronelismo político e aristocrático rual e de imobilidade social semifeudal.

        1. Silva

          Acho que liberdade de expressão não pode ser comparado com agressão. O blogueiro ao abrir espaço para opiniões de leitores, deve se ater a publicar o que estiver dentro do texto tratado, seja contra ou a favor, mas que estejam focadas dentro do assunto tratado. Pensarei duas vezes ou mais antes de emitir qualquer comentário ou até ler outros textos aqui, pois nossa opinião, ao invés de ser questionada dentro da educação que todo meio de comunição deve prezar, é achincalhada desmedidamente sem o zelo que se teve ter por parte do respeitado canal.

          1. Silva

            Aliás, o próprio site diz que “a área de comentários visa promover um debate sobre o assunto tratado na matéria. Comentários com tons ofensivos, preconceituosos e que que firam a ética e a moral não serão liberados”.
            Não é o que acontece na prática, com todo respeito.

  6. CSA campeão Brasileiro e Alagoano

    Este é o Roberto Vilanova que eu acompanhava no jornal extra.
    Excelente matéria, este é o nosso nordeste querido. Parabéns!

    1. Melquíades de Souza

      Mas quem organizou a matéria foi Aprigio Vilanova. Você não fala coisa com coisa. Presta mais atenção: Lula Livre é o grito do Brasil!!!!!

  7. desportista

    No texto encontramos a gênese da rapinagem de uma parte da polícia alagoana, quando o dileto blogueiro retrata a caça ao tesouro acumulado pelo cangaço. Pelo visto, o pai do meu ex-colega de caiaquismo tinha cadeira cativa nas volantes. Abç.

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