Os fuzis da revolução
   29 de março de 2014   │     16:40  │  2

Brasília – No período mais duro do regime militar e quando ainda se alimentava o sonho de um modelo comunista de produção e convivência social, ou mais detalhadamente, no período da “guerra fria”, eu fui servir ao Exército.

Confesso que tentei não ir; o meu primo-irmão Ailton Villanova era amigo e vizinho do capitão Moreira, que era o médico do então 20ºBC, e pedi para que intercedesse na minha dispensa sob a alegação de que ara arrimo de família – o único filho homem na prole de seis filhos.

Em vão.

Aprovado nos exames médicos, eu fui designado para a 2ª Companhia de Fuzileiros. Época dura; não esqueço o episódio no treinamento no campo do Exército em Aldeias, Pernambuco, com munição real e o acidente que quase nos matou se não fosse a astúcia do tenente Alves – que mais tarde reencontrei como dr. Ciro, médico pediatra dos meus filhos e da minha neta Letícia.

– No chão, porra, no chão! Gritou o Ciro, que era o comandante do nosso pelotão, empurrando a mim e ao Fagundes, enquanto duas granadas de morteiro se encontraram no ar sobre nossas cabeças numa inexplicável coincidência de terem sido disparadas ambas com os mesmos ângulos de tiro.

Ufa! Foi por pouco. Ficamos devendo nossas vidas ao Ciro.

Mas, nada me marcou mais do que ter descoberto depois quem “subtraia” os FAL (Fuzil Automático Leve) do quartel e causava todo aquele reboliço; toda aquela confusão. Roubaram o fuzil do Liberato, que era do meu pelotão.

O Liberato era filho do coronel PM Albuquerque, que foi chefe do Gabinete Militar do então governador Fernando Collor, e depois serviu na Presidência da República quando o Collor foi presidente. Além de pertencer ao mesmo pelotão que eu, o Liberato era parceiro de farra e foi assassinado na Ponta da Terra num dia de folga ao tentar desarmar um criminoso que havia matado uma pessoa no bar onde ele estava bebendo.

O FAL do Liberato sumiu, assim como também sumiu o FAL dos três companheiros que tinham sido dispensados porque foram aprovados no curso de sargento do Exército e no Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar.

Ou seja: quem levava os fuzis sabia o que estava fazendo.

Pois bem; em 1971 eu dei baixa e fui morar em Recife, depois voltei para Maceió, o meu primo-irmão Ailton Villanova inventou que eu era jornalista, com o aval do Freitas Neto e do Márcio Canuto, e daí conheci o Dênis Agra.

Quando lançaram a Tribuna de Alagoas, o Dênis era o editor e me chamou para ser o repórter-especial. Uma noite ele me apresenta ao chefe da revisão, que era um formando em Medicina e logo eu o reconheci da época de quando servi ao Exército.

Era aspirante e quando eu dei baixa foi promovido a tenente. Era o 2º tenente Menezes e eu, sem estar a par de todas as aventuras da terrinha logo após dar baixa, não sabia da história do Dênis e do Denisson, dois estudantes de Medicina da Ufal que tinham sido presos acusados como subversivos e “perigosos comunistas”.

E eu ainda perguntei para o Denisson:

– Você não é o aspirante Menezes?

Ambos riram e o Dênis Agra ainda perguntou se na época em que servimos tinham “roubado” muitas armas do quartel. E eu contei das armas que eu sabia que tinham sido “subtraídas para a revolução popular”, como consertou o Dênis.

– Que eu saiba sumiram quatro fuzis!

Mais tarde, eu tive o prazer e a oportunidade de conhecer a jornalista Iara Malta, filha do Denisson Menezes. Eu perguntei a Iara como o pai dela foi preso e ela me respondeu:

– Minha mãe me contou que meu pai estava de oficial de dia e pediu a minha mãe para ligar para ele à noite, lá pelas oito horas da noite, e explicou que se ele não atendesse ao telefonema era porque estava preso.

Ou seja, caiu todo mundo, inclusive o Dênis Agra, o Breno, irmão dele, o Norton, o Jeferson, o Fernando Costa… os jovens idealistas que queriam fazer a revolução com os fuzis do 20 BC – que hoje é o 59 BIMtz.

 

 

COMENTÁRIOS
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  1. Evandro

    Fico pensando o “SE”!
    Se o Exército na época tivesse logo após o golpe, convocado novas eleições e entregue o poder ao novo eleito.
    Se os Oficiais daquela época não cometessem os erros que cometeram e cumprissem sua missão, e a missão do Exército.
    Se as coisas fossem desse modo, eu sinceramente acho que hoje muita coisa seria diferente, tinha que se arranjar outro motivo pra se colocar a culpa das coisas, de todos os erros da história.
    Eu acho que o povo já teria saído as ruas pedindo que o Exército prendesse os ladrões do DF, todos, alterasse a lei pra que todos aqueles ladrões disfarçados de políticos fossem presos, convocasse novas eleições e logo após devolvesse o poder ao eleito, tudo isso em menos de 2 meses. mas isso SE, só SE. abraços!

  2. santos

    E ainda falam que o exercito torturava,roubavam os fuzis que não tem outro nome pra isso,foi assim que o capitão lamarca foi persequido e morto pelo exercito tido como traidor,pra o que os comunistas fixeram na epoca o exercito ainda foi bonzinho.

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