Brasília – Passados 124 anos da proclamação da República, e somente agora nas últimas duas décadas é que o brasileiro experimenta a estabilidade política combinada com a estabilidade econômica.
Os pais e os avós de muitos de nós não vivenciaram isto. Nunca, na história deste país, a sociedade brasileira viveu 20 anos ininterruptos de estabilidade política.
O suicídio do presidente Getúlio Vargas, em 1954, adiou por dez anos o golpe que instalou o governo militar – que durou até 1984, ou seja, 20 anos.
Nesses 124 anos, com exceção dos últimos 20 anos, a história da República brasileira ficou marcada por períodos de agitações que levaram a governos duros que até podem ser chamados de ditadores – que se regiam por uma Constituição sob medida.
Mas, o que aconteceu? Que milagre é esse que já dura 20 anos?
O milagre tem vários santos. Vamos enumerar: se o Fernando Collor quando foi presidente não tivesse deixado uma reserva cambial perto de 60 bilhões de dólares, o Itamar Franco não teria lastro para mandar o Fernando Henrique Cardoso fazer o Plano Real com o câmbio ao par.
Também foi o Collor que escancarou o mercado interno e fez surgir um novo tipo de empresariado brasileiro, que se move pela competição. Até o governo Collor, o empresariado nacional vivia às custas da União, no mínimo, como beneficiário das medidas que o protegia da competição.
Quando disse que os automóveis nacionais eram carroças, o Collor chutou o pau da barraca e atraiu contra si a ira dos que jamais tinham sido incomodados; o mercado até então sempre se regulou pelas medidas protecionistas, e o Collor acabou com a farra.
Gostem dele ou não, mas deixar de reconhecer esse mérito é pura mesquinhez.
Há 20 anos que o nome do dinheiro brasileiro é o mesmo e isto também é inédito. Já se chamou de tostão, mil-réis, pataca, cruzeiro novo e velho, cruzado e também já se misturou com outras “moedas” que circulavam à marginalia, tais como a URV e o dólar, com os quais muita gente numa época recente fechava os seus negócios.
Nos últimos 20 anos um ex-operário chegou ao poder; uma ex-guerrilheira está no poder, e as instituições nacionais não sucumbiram como pregavam os antepassados durante a paranoia anti-comunista.
É como se a taboca do foguete onde muitos partiram segurando pelo rabo retornasse à terra, depois de cumprir com a missão.
O Collor deixou a base para o Plano Real, o Itamar fez, o Fernando Henrique aplicou, o Lula aperfeiçoou e a Dilma está mantendo e nisso já se vão 20 anos!
Parece-me que finalmente o Brasil encontrou a República que precisava. Mas não vamos nos queixar pela demora, porque a República que foi proclamada em 1889 deveu-se a uma dor-de- cotovelo do marechal Deodoro.
Seguinte: o marechal Deodoro não saiu às ruas para proclamar a República e sim para derrubar o ministério chefiado por Ouro Preto.
É sabido que a Marinha pertence ao rei e depois da Guerra do Paraguai espalharam a notícia de que Ouro Preto iria acabar com o Exército. Deodoro não gostou e reagiu.
Mas não queria derrubar Pedro II; queria apenas trocar o comando do ministério, e Pedro II aceitou nomeando o gaúcho Silveira Martins.
Pronto! Foi o fim da picada.
O Deodoro era apaixonado pela Baronesa de Triunfo, no Rio Grande do Sul, e ela optou por Silveira Martins – que Deodoro tomou por desafeto, sem sarar a dor-de-cotovelo.
E como Pedro II não recuou da escolha, perdeu o trono e o jeito foi implantar a República – que, 20 anos depois, já estava velha.